



Poucas vezes li algo que se assemelhasse a realidade deste tipo de relacionamento, talvez por que a maioria das pessoas que se prestam a escrever sobre isso não tenham hoje ou não tiveram no passado algum relacionamento próximo a esse, criando assim uma rede de meias verdades, falsos mitos e retumbantes enganos.
Para início de conversa temos que ter em mente que um casal SM nada mais é do que um casal como outro qualquer, mas que tem tesão em um tipo de relação sexual e afetiva específica. Um casamento SM não difere em quase nada de um casamento baunilha. Existem dias bons e ruins, contas a pagar, preocupações com relação a casa, compras, etc...
Uma das perguntas que mais vejo é se um casal SM é SM todos os dias. Bem, respondo por mim: Não! Isso seria impossível. Na relação que tenho com meu marido, que é meu Dono, temos decisões no dia-a-dia a serem tomadas que impedem a postura submissa 24 horas.
Se existem desentendimentos, brigas? Claro, somos pessoas normais e resolvemos nossas diferenças como todo casal faz (ou pelo menos deveria fazer) sentando, conversando e colocando as cartas na mesa. Se vivêssemos a utopia de um relacionamento eternamente 24x7 isso seria impossível, haja vista que uma submissa não poderia discordar, cobrar ou impor nada ao seu Dono e muitas vezes tenho tais atitudes com relação ao meu marido, como toda esposa o faz.
Se existe rotina? Bem, quem usa essa premissa para desmerecer um relacionamento estável, está demonstrando superficialidade e desconhecimento de causa, uma vez que qualquer casal, casado ou não, que esteja junto há muito tempo, tende a estabelecer rotinas, mas nem sempre isso é ruim, cabe ao casal construir um relacionamento em que a rotina não seja desgastante, mas apenas confortável, traga a sensação de aconchego, de conforto, mas não enferruje o sentimento. E isso é fácil, basta boa vontade, desejo e respeito mútuo.
Li em algum lugar que depois de algum tempo o Dominador iria se cansar da submissa. Ora, que empáfia. Se assim o for, todo relacionamento BDSM teria prazo de validade! E o sentimento? E o amor? Onde ficam? Essa teoria só pode ser criada por pessoas que não conseguem manter uma relação duradoura e assim, para justificar sua alternância ou mascarar a carência usam desse subterfúgio. Dominadores e submissas que estão juntos a certo tempo sabem, tanto quanto eu, que isso não é realidade. Quem realmente gosta do seu companheiro (ou companheira) continua gostando e sentindo tesão sem tempo pré definido. E arrisco mais, com o crescer da relação a probabilidade versa no sentido de se fortalecer o sentimento e o desejo.
Regozijamos-nos na certeza de que um dia “ela”, que não nos esquece, emerja do grasso buraco emocional em que mergulhou e passe a nutrir por nós dois, como casal e como pessoas, a mesma indelével indiferença que sentimos, hoje, por ela. Mas até lá, boa sorte nas tediosas tentativas de ofensa e de imiscuir-se um presente que não mais a comporta.
A maturidade emocional é, no meu entendimento, um dos fatores primordiais para uma relação BDSM atingir seu real potencial.
Usando as palavras da Rainha Frágil: “BDSM é um jogo de gente grande”, tenho, para mim, ser esta uma verdade absoluta e incontestável. Para que uma pessoa possa realmente se lançar nesse universo e alcançar algo mais que um orgasmo fajuto tem que haver maturidade psicológica, sexual e principalmente emocional.
A primeira coisa que sugiro para quem está entrando é que tente entender que BDSM não é um jogo puramente físico, o aspecto psicológico é superlativo. BDSM não é equânime, sendo, na maioria das vezes, intenso e injusto, mas são estes aspectos que o tornam mais vívido, mais envolvente e mais prazeroso.
Creio que uma pessoa sem calos emocionais, sem a vivência sexual necessária, por mais que tenha anos de vida acumulados, pode acabar se perdendo nas linhas e entrelinhas deste meio e com isso se machucar muito. As ilusões e fantasias calcadas nas expectativas baunilhas da vida podem imperar e acabar trazendo para um relacionamento BDSM, que por si é cheio de regras e meandros, emoções tipicamente adolescentes.
Esse conflito acaba por ser danoso aos parceiros, às vezes com conseqüências mais sérias, tais como o abandono do meio e a aversão ao jogo, ocasionadas simplesmente por terem se inserido em uma relação BDSM antes do amadurecimento devido.
Necessário, pelo que entendo, é que para uma pessoa ingressar nesse jogo sexual, deve ter antes acumulado alguns quilômetros de experiência sexual baunilha, ter aprendido a aceitar, ouvir e entender seu corpo, seu tesão e suas vontades. É obrigatório conviver bem consigo mesmo e na relação sexual, ter aprendido a se expor sem vergonha, neura ou medo. E ainda ter em mente que nem sempre o que dá tesão no papel, no vídeo, na web vai dar o mesmo tesão na pele, na carne.
Logicamente que vivência&maturidade não tem sempre ligação com a idade cronológica, existem pessoas de idade já avançada que se mostram emocionalmente atrasadas ou até mesmo deficientes emocionais e outras ainda que mal iniciaram sua juventude já se mostram maduras o bastante para discernir a fantasia do real e identificar os motivos e o momento correto que a levem ao BDSM
Um dos enganos mais comuns, que tenho visto nesses anos de experiência, é a confusão entre o relacionamento BDSM e o baunilha. Quando se entra em um canil, em uma senzala, não se está iniciando um relacionamento de namoro, são coisas distintas, se bem que podem, futuramente, se mesclar, porém, entrar no relacionamento, desde o inicio, vendo o Dono(a) ou submissa(o) como um namorado(a), é caminho certo para desilusões e fracassos.
Considero que isso se deva, principalmente, ao fato de que com a popularização do BDSM, que tem sido referenciado até em novelas, aparecem no meio, centenas de pessoas que, no momento não estão “inteiras” o bastante para entrar, bem como centenas de fakes e de pessoas patologicamente prejudicadas, que vêem no BDSM a última saída para conseguir um parceiro ou mesmo uma forma de punição para suas neuroses e psicoses, sem deixar de lado a questão da baixo estima, que será objeto de um próximo post.
Se ainda existirem aqueles que tem vontade e tempo para falar mal de nós, só podemos lamentar.
Nós, por não considerarmos importante, por nos faltar tempo e por absoluta indiferença não nos damos a esse trabalho.
Seguir com a própria vida, se importar apenas consigo é trabalhoso e difícil demais para quem não tem um foco, um objetivo desvinculado da vida do outro, mas infelizmente é a única realidade para muitos. Multidões de "zumbis" andam vagando pelo mundo, vendo sentido em suas vidas apenas quando conseguem falar ou fazer mal a outra pessoa.
Entre o que pensam, desejam ou falam de nós e o que somos, temos, fazemos e realizamos existe uma diferença abissal. Então para que se dar ao trabalho de se importar com o que não é importante ou verdadeiro?
Viver e ser feliz já é tarefa por demais complexa.
Assim, viva e deixe viver.